1. Introdução
Este
trabalho pretende inter-relacionar os processos básicos de psicologia com as disciplinas
teóricas através de observação em campo. Esta observação foi realizada no no
Serviço de Psicologia Aplicada (SPA), localizado no Núcleo de Atenção Médica
Integrada (NAMI) da Universidade de Fortaleza (UNIFOR). A observação foi feita
de forma estruturada, não participante e em equipe. O público alvo foi um grupo
em psicoterapia composto por 3 pessoas. Este grupo foi avisado previamente que
seriam observados, e nós observadores, fomos orientados sobre o nosso papel
ético diante de nosso trabalho.
Os
processos básicos são: sensação, percepção, memória, emoção, inteligência,
linguagem e aprendizagem. Tentaremos indicar a presença dos processos básicos e
das abordagens psicológicas diante das observações descritas sobre o
comportamento e sobre a fala do grupo. É importante perceber o grande valor da
observação no cotidiano do psicólogo, pois é através desta observação atenta,
seja através da fala ou do comportamento, que o psicólogo colhe todos os
elementos necessários para o processo terapêutico ou analítico.
2. Quadro Teórico
2.1. Abordagens Psicológicas
2.1.1.Psicanálise
Segundo
Braghirolli (1990, p.21), a psicanálise, criada por Sigmund Freud, é
provavelmente, a abordagem psicológica mais conhecida pelo público em geral,
apesar de não ser igualmente bem compreendida. Este sistema, que influenciou e
ainda influencia tão fortemente não só os rumos da Psicologia, mas também das
artes, da literatura, enfim, de toda a cultura ocidental, teve um
desenvolvimento inicial bastante independente da Psicologia como tal.
Segundo
Roudinesco (1944, p.130-132), a psicanálise, como corrente de pensamento, deu
origem a correntes teóricas distintas umas das outras, e que foram a expressão
de consideráveis reformulações. O freudismo inclui o conjunto de correntes que
recorrem, simultaneamente, a um método clínico centrado no tratamento pela fala
e a uma teoria que pressupõe uma referência comum à sexualidade, ao inconsciente
e à transferência. Freud nunca parou
de reformular seus próprios conceitos, não apenas modificou a teoria da
sexualidade em função da experiência clínica, como também transformou de ponta
a ponta sua doutrina, passando da primeira tópica (consciente, pré-consciente,
inconsciente) para a segunda (eu, isso,
supereu) e, posteriormente forjando a idéia da pulsão de morte. O freudismo
clássico repousa no modelo de Édipo, a tragédia inconsciente de incesto e do
crime que se repete no drama da consciência culpada. O complexo de Édipo é a expressão de dois desejos recalcados (desejo
de incesto e desejo de matar o pai), ele é universal, uma vez que exprime as
duas grandes proibições fundadoras de todas as sociedades humanas.
Conforme Goodwin (2005, p.431-432,444), na
quinta e última conferência de Freud, ele descreve a importância da
transferência para o sucesso da psicanálise e externava a esperança de que a
libido do sujeito, a energia psíquica associada a pulsão de vida, pudesse ser
direcionada para atividades socialmente úteis, num processo ao qual se referiu
a sublimação. Voltando a segunda tópica, segundo Goodwin, o eu é uma parte consciente e outra
inconsciente, é o pólo do psiquismo que tem a função de equilibrar as
exigências feitas pelos outros pólos, o isso e o supereu, além também de
conciliar todos esse conflitos com o meio social. O isso é o pólo pulsional de ordem consciente e inconsciente,
totalmente desregrado e caótico, ele exige constantemente a satisfação de suas
necessidades de prazer. O supereu é
onde estão registrados os valores morais aprendidos de cada sujeito, ele
trabalha e inibe a livre expressão das necessidades do “isso”. Entre as
contribuições da psicanálise, destacam-se os conceitos de inconsciente e recalque, a ênfase na importância da
tenra infância e a insistência na natureza psicológica dos distúrbios mentais.
2.1.2.Behaviorismo
Baseado
em Goodwin (2005, p.389-404), Skinner, criador do behaviorismo radical,
distinguiu o condicionamento clássico de Tolman e Hull do condicionamento
operante, no qual defendia um behaviorismo mais indutivo e descritivo. Criando
assim, um behaviorismo que simplesmente buscasse evidências de comportamentos
que pudessem ser previstos e controlados, através da análise experimental do
comportamento, ou seja, da descrição completa dos comportamentos, dos ambientes
em que se verificam e das conseqüências
imediatas desses comportamentos. O condicionamento operante se dá quando o
comportamento é modelado pelas conseqüências imediatas, se estas forem positivas, o comportamento que se
verifica num ambiente específico terá maior probabilidade de ocorrer nesse
ambiente no futuro, mas se forem negativas,
a ocorrência desse comportamento terá menor probabilidade.
2.1.3.Humanismo
Conforme
Braghirolli (1990, p.22), o Humanismo é o movimento mais recente em Psicologia,
que enfatiza a necessidade de estudar o homem como um todo. O homem tem
características próprias, é singular e complexo, e por isso não pode ser
investigado com os mesmos procedimentos aplicados ao estudo de ratos ou outros
animais de laboratório. Além disso, o homem tem capacidade de avaliar, de
decidir, de escolher, não sendo um ser passivo que apenas reage aos estímulos
do meio. É alguém que se caracteriza pelas suas potencialidades, pela sua tendência atualizante a realizá-las,
por estar em contínua modificação.
Segundo
Goodwin (2005, p.456-461), a abordagem humanista propõem que as qualidades que
melhor caracterizam os seres humanos são o livre-arbítrio e a sensação de
responsabilidade e propósito, a busca eterna e progressista de sentido na vida
e a tendência inata de crescer rumo à assim chamada auto-realização. Auto-realizar-se significa atingir seu potencial de
vida em toda a sua plenitude. Um dos grandes expoentes da psicologia humanista
foi Carl Rogers (1902-1987), criador da Abordagem Centrada na Pessoa(ACP). Três
tributos constituem a essência da ACP, primeiramente é a autenticidade da pessoa em relação com o outro. Na terapia, é um
fator fundamental para que o cliente mude e cresça de um modo construtivo, sem
haver resistências em relação do paciente com o terapeuta. O segundo ponto
importante seria o olha positivo
incondicional. É quando o terapeuta tem uma atitude aceitadora em relação
ao que quer que o outro seja naquele momento. O terceiro aspecto seria a empatia, com isso o terapeuta capta com
mais precisão os sentimentos e significados pessoais que o cliente está
vivendo, e comunica essa compreensão obtida para o cliente.
2.2. Processos Psicológicos Básicos
A
seguir, apresentaremos uma amostra conceitual de cada processo básico, que
serviu de embasamento para as nossas observações.
2.2.1.
Inteligência
No senso comum a inteligência é a
qualidade que as pessoas possuem para resolver um problema de forma correta,
adaptar-se a novas situações e aprender coisas com facilidade. As concepções
científicas de inteligência variam. Algumas consideram inteligentes os
indivíduos capazes de um pensamento abstrato, capacidade de adaptação ao
ambiente, adaptação a situações relativamente novas e capacidade de aquisição
de novos conhecimentos. Algumas teorias postulam a existência de uma
inteligência geral, outras postulam a existência de faculdades diferenciadas e,
outras ainda, de múltiplas aptidões independentes. Algumas abordagens da
psicologia entendem a inteligência como a capacidade de verbalizar idéias,
compreender instruções, perceber a organização de um desenho, resolver
problemas, adaptar-se a novas situações e ter comportamentos criativos.
O nível de
inteligência, nestas abordagens, é medido por testes psicológicos de
inteligência. Estes testes medem o quociente intelectual (Q. I.), que é obtido
através da relação da idade e o desempenho no teste proposto, verificando se o
desempenho está de acordo com a idade. Acredita-se que se o desenvolvimento do
indivíduo for estável, o Q. I. tende a se manter estável, e que se as condições
de desenvolvimento forem alteradas para melhor ou pior, isto interferirá no Q.
I. Outras abordagens questionam o termo inteligência porque acreditam no
organismo na sua totalidade e este termo passa a ser um adjetivo. Este último
grupo não acredita que os testes podem medir a inteligência e no máximo
consideram que podem medir a eficiência intelectual do indivíduo. Para estas
teorias, os testes tornam-se dispensáveis na maioria das vezes, e o
rebaixamento intelectual deve ser considerado como conseqüência do que o
indivíduo vive no momento e, portanto, depende da história de vida do sujeito.
O exemplo que estas teorias utilizam é dispersão que nos acontece quando temos
uma preocupação, um conflito ou um problema e ficamos dispersos, pensando nele,
o que nos faz ter dificuldade de aprender.
2.2.2. Percepção
A
percepção diz respeito ao processo através do qual os objetos, pessoas,
situações ou acontecimentos reais se tornam conscientes. É através da percepção
que o ser humano conhece o mundo à sua volta de forma total e complexa. A
percepção distingue-se da memória, porque diz respeito a acontecimentos
presentes e também é diferente da inteligência e pensamento na medida em que se
refere a situações concretas. A percepção é mais um conceito em psicologia que
possui diferentes considerações, a depender da abordagem teórica. Ela pode ser
entendida como produto de vários elementos sensitivos ligados a experiências
que o indivíduo tem anteriormente, pode ser entendida de maneira bem global,
sendo irredutível às sensações, ou pode ter características tão amplas que se
confunde com qualquer processo cognoscitivo. Para que o objeto possa ser
percebido, ele deve se destacar do mundo fenomenológico, possuindo uma
estrutura interna maior do que os outros objetos que o cercam para que se
constitua uma “boa figura”, caracterizando o resto como “fundo” sobre o qual
ele se destaca. A “figura” e o “fundo” podem sofrer modificações, dependendo de
diversos fatores relacionados com a percepção. A estimulação é fundamental na
definição do que constitui a “figura” e no que constitui o “fundo”. Muitas
vezes a passagem de “figura” para “fundo” e vice-versa acontece por causa da
saturação produzida pelo sistema nervoso quando a estimulação torna-se
excessiva. A atitude de um indivíduo, a movimentação do objeto, movimentação da
cabeça, interposição dos objetos, tamanho relativo, perspectiva linear e o jogo
de luzes e sombras também são alguns dos fatores que determinam o que se define
como “figura” e o que se caracteriza como “fundo”. A percepção depende de uma
série de fatores precisos, mesmo quando se trata da percepção de um movimento
ilusório ou da movimentação de outro objeto que não o que realmente se move.
2.2.3. Aprendizagem
A aprendizagem é o processo através do
qual a criança se apropria ativamente do conteúdo da experiência humana,
daquilo que o seu grupo social conhece. Para que a criança aprenda, ela
necessitará interagir com outros seres humanos, especialmente com os adultos e
com outras crianças mais experientes. Nas inúmeras interações em que envolve
desde o nascimento, a criança vai gradativamente ampliando suas formas de lidar
com o mundo e vai construindo significados para as suas ações e para as
experiências que vivem. Com o uso da linguagem, esses significados ganham maior
abrangência, dando origem a conceitos, ou seja, significados partilhados por grande
parte do grupo social. A linguagem, além disso. Irá integrar-se ao pensamento,
formando uma importante base sobre a qual se desenvolverá o funcionamento
intelectual. O pensamento pode ser entendido, desta forma, como um diálogo
interiorizado.
A Psicologia
da Aprendizagem estuda o complexo processo pelo qual as formas de pensar e os
conhecimentos existentes numa sociedade são apropriados pela criança. Para que
se possa entender esse processo é necessário reconhecer a natureza social da
aprendizagem. Como já foi dito, as operações cognitivas (aquelas envolvidas no
processo de conhecer) são sempre ativamente construídas na interação com outros
indivíduos.
2.2.4. Memória
A memória é
segundo Miranda Sá, “é o recurso psicológico integrativo que garante a integração
de cada momento da consciência. Configura uma totalidade que é vivenciada como
uma realidade existencial temporal, a qual é sentida e percebida como unitária.
Enquanto a consciência assegura a integração imediata de todos os processos
psicológicos em uma unidade imediata, a memória assegura sua integração,
temporal. A capacidade mnêmica fornece o elo que garante a unidade temporal da
vida psíquica de uma pessoa em relação com o mundo. Relata o passado e presente
e permite perspectiva para o futuro”.
Um
outro conceito sobre memória é de G. Olerón, “memória é um conjunto de
atividades que integram processos biofisiológicos, assim como
sócio-psicológicos, que só podem ser reproduzidos atualmente porque certos
acontecimentos anteriores, próximos ou distantes no tempo, modificaram, de
maneira persistente, o estado do organismo”.
Podemos
dizer que no ato da memória existe em três fases. A primeira fase é a de
fixação que pode sr definida como a capacidade de gravar imagens e informações
na memória para sua posterior evocação. A qualidade e a eficiência da fixação
estão indicadas pela persistência e precisão da conservação do que foi fixado.
A segunda fase é da evocação. A evocação é a capacidade de atualizar os dados
que haviam sido previamente fixados. As informações mnêmicas são fixadas,
conservadas e evocadas sob a forma de “imagens” da memória que pode ser
denominada de engramas. A “imagem” evocada, o engrama atualizado, corresponde a
um reflexo, no presente, de experiência passada. O esquecimento se dá pela
impossibilidade de evocar.
A ultima fase é a do reconhecimento, que é
capacidade de reconhecer a representação evocada como um componente previamente
fixado e não como uma experiência nova da consciência. O reconhecimento permite
a comparação da imagem do objeto recordado com a percepção ou imagem do objeto
que o teria originado. O reconhecimento manifesta-se desde a percepção como um
instrumento de verificação funcional da eficiência e não pode ser entendido
isolado do restante dos componentes psíquicos. Segue os tipos de memórias:
memória sensorial, ela registra temporariamente (frações de segundos)
informações que nos são transmitidas pelos sentidos;
memória curto prazo, ela registra informação a que prestamos atenção por
períodos de cerca de 1m; e memória a
longo prazo, registro permanente da informação.
2.2.5. Emoção
2.2.5.1. Afetividade
Pode-se
chamar de afeto o conjunto de fenômenos psíquicos que se manifestam sob a forma
de emoções, sentimentos e paixões. Acompanhados
sempre da impressão de dor ou prazer, de satisfação ou insatisfação, de agrado
ou desagrado, de alegria ou tristeza e etc. É a afetividade que determina a
atitude geral do indivíduo diante de qualquer experiência vivida, ela promove
os impulsos motivadores e inibidores.
Segundo
Jean Delay, o estado de ânimo ou humor é a “disposição afetiva fundamental,
rica em todas as instâncias emocionais e vitais, que dá a cada um dos nossos
estados de ânimo uma tonalidade”. Existe para cada individuo um estado afetivo
momentâneo, que pode variar de momento para momento, (alegre, triste,
deprimido, bem e etc.) e depende das circunstancias pessoais de vida. Nem todos
os indivíduos tem os mesmos limites, o estado de felicidade de uns pode ser bem
mais elevados que outros. A afetividade funciona como uma lente que filtra a
realidade percebida por cada um de nós e através de matizes, dá um colorido
diferente às variáveis de todos os relacionamentos do sujeito com o meio.
2.2.5.2. Sentimento
O sentimento é o estado afetivo atenuado,
estável, duradouro e organizado com maior riqueza e complexidade do que os
fatores representados. Max Scheler classificou os sentimentos em quatro grupos:
sentimentos sensoriais, sentimentos vitais; sentimentos psíquicos ou anímicos,
considerados como sentimentos do eu; sentimentos espirituais ou da
personalidade.
Os
sentimentos sensoriais se encontram muito próximos da corporalidade, estão
localizados em determinadas partes do corpo, como a dor e o prazer. Possuem
algumas características especiais, como: atualidade e localização, duração
definida e aos mesmos falta intencionalidade. Os sentimentos vitais vem de
dentro do ser, como o bem estar e o mal estar, o sentimento de saúde ou de
enfermidade, a calma e a tensão, a alegria e a tristeza e a angústia não
espiritual. Ao contrario dos outros, os sentimentos vitais não estão
localizados em partes do corpo, neles existe continuidade, duração e
intencionalidade. Os sentimentos psíquicos ou anímicos. Eles não estão ligados
diretamente à percepção, mas ao sentido, ao significado do percebido. Já os
sentimentos espirituais estão subordinados aos conteúdos das vivencias,
trata-se de sentimentos relativos ao núcleo da personalidade. A beatude, o
desespero, o remorso, a paz e a serenidade espiritual são exemplos desta
suprema região da vida emocional, na qual o ser pessoal não está entregue a
nada alheio. A emoção é um estado afetivo intenso e complexo, proveniente de
uma reação ao mesmo tempo psíquica e orgânica, do indivíduo inteiro, contra
certas excitações internas ou externas.
2.2.6.
Linguagem
A aquisição da linguagem é o processo pelo
qual a criança
aprende sua língua materna. A respeito desse processo, há boas
razões para afirmar que a aquisição da primeira língua é a
maior façanha que podemos realizar durante toda a vida. Explicar esse processo
é hoje considerado uma das tarefas centrais da lingüística. Muitos estudos
nesta área se associam a psicolingüística.
2.2.7. Sensação
A Psicologia da sensação estuda a capacidade de um organismo
detectar e distinguir estímulos. Como tipos de sensações externas temos os
sons, as luzes, as pressões, e etc. E como tipos de sensações internas temos a
fome, o sono, a dor, entre outros.
As
sensações surgem sempre associadas a estímulos (correspondentes aos cinco
sentidos). O limiar absoluto é a energia mínima do estímulo necessária para
produzir uma sensação e o limiar diferencial é a diferença mínima perceptível
entre dois estímulos. Weber apresenta uma lei que permite calcular a Diferença
Mínima Perceptível, que é a LEI DE WEBER a “quantidade” de energia que deverá
ser acrescentada a um estímulo de valor zero, para que o sujeito consiga
detectar a diferença entre o primeiro e o segundo estímulo. A aplicabilidade da
Lei de Weber no domínio do consumo dá-se a dois níveis: o primeiro é estimular
o consumidor a detectar a diferença entre dois estímulos (Ex. Pepsi e
Coca-Cola) e o segundo é procurar que o consumidor não detecte diferenças entre
dois estímulos.
3. Descrição dos Dados
O Ambiente observado localiza-se no SPA (Serviço de
Psicologia Aplicada) localizado no NAMI (UNIFOR). A sala onde é realizada a
terapia em grupo é bem iluminada (cor:branca), com ar-condicionado, possui um
quadro branco com alguns pincéis, um quadro decorativo, algumas almofadas em
vários tons de verde, algumas cadeiras, uma mesa, um relógio de parede, e um
colchonete. Todos tiravam os calçados ao entrarem na sala, e se acomodavam nas
almofadas ou no colchonete de forma bem confortável. Na pré-observação estavam
na sala estavam o terapeuta, duas clientes e uma estagiária. A sessão começou
com apenas duas clientes, do total de seis, que fazem parte do grupo. Na
observação, propriamente dita, estavam presentes três clientes, o terapeuta e a
estagiária.
3.1. Pré-observação (fala e comportamento)
Ao entrar na sala, a Cliente 1, senhora de
aproximadamente 50 anos, reclamou do ar-condicionado, falando que a sala estava
muito fria e realizando alguns movimentos na tentativa de aquecer o corpo,
esfregando as duas mãos, e passando as mãos pelos braços. Ela, acomodou-se nas
almofadas com as pernas esticadas e cruzadas, os braços também estavam
esticados e cruzados e as mãos estavam acomodadas entre as pernas, sendo que a
posição dos braços se alternavam entre esticadas e cruzados ou apenas cruzados.
Esta cliente ficou quieta durante a sessão e estava bastante pensativa, seu tom
de voz era muito baixo e suave. Quando falava, ela pouco gesticulava. Mostrou
sinais de cansaço e sono, pois bocejava bastante, esfregava as mãos nos olhos,
tirava e colocava os óculos, passava a mão sobre a cabeça, olhava para cima,
fechava os olhos. Ela também, aparentemente, escutava com atenção o que a outra
cliente dizia, pois o seu olhar estava direcionado para a outra cliente, às
vezes concordava com o que estava sendo dito, balançando a cabeça, e quase no
final da sessão ela mudou a posição em que estava sentada, ficando com a
direção do corpo voltada para a outra cliente.
A Cliente 2, uma jovem de 20
e poucos anos, inicialmente pouco participativa durante as sessões anteriores,
demonstrou desejo de participar mais do processo terapêutico, falando “que até hoje não participei muito das
sessões, mas hoje eu vou aproveitar pra falar mais”. Ela se acomodou nas
almofadas, sentando e ficando com as pernas dobradas, às vezes ela esticava e
cruzava as pernas. Ela realmente foi a cliente que mais interagiu na sessão,
falou sobre as suas dificuldades familiares, amorosas, financeiras e também
falou um pouco sobre as dificuldades de sua infância e sobre a vida acadêmica.
Mostra há desgaste familiar na relação com a mãe e com a irmã, que assumiu cedo
muitas responsabilidades, e que tem dificuldades para arrumar um companheiro e
esse, dentre outros fatores, a faz se sentir velha. Ela falou muito sobre os
problemas familiares e financeiros, enfatizando a sua relação com a mãe
biológica e adotiva, e a falta que sente de um pai. Há momentos que se coloca
no papel de vítima. Durante a sua fala, ela gesticulava bastante, esfregava ou
coçava o nariz e movimentava bastante os pés. Enquanto falava, olhava para o
terapeuta, para a outra cliente e às vezes olhava para o chão, durante as
pausas de silêncio, ela também olhava para o chão. Segundo ela, quando ela tem
algum problema, ela utiliza o ato dormir como uma fuga para enfrentar a
realidade. A sua fala era repleta de “não sei porquê” ou apenas “não sei”.
O terapeuta deixou as clientes bem à vontade e
livres para manifestarem a sua fala. Realizou apenas duas intervenções. Estava
deitado nas almofadas. A estagiária agiu de forma semelhante e realizou apenas
uma intervenção. Estava sentada no colchonete. Tanto o terapeuta como a
estagiária, estavam posicionados de frente para as clientes. Na sua primeira intervenção
o terapeuta fez a seguinte pergunta: “O
que você sente quando fala sobre isso?”. Já na segunda intervenção ele faz
o seguinte questionamento: “Será que não
é você que permite isso?”;
Durante a
fala da Cliente 2, esta, pergunta à Cliente 1 se ela quer falar algo, e esta
responde que não, denotando assim, um interesse em escutar outra pessoa, mesmo
tendo tanto a falar.
3.2. Observação (fala e comportamento)
Neste
dia de observação, estavam presentes três clientes, uma estagiária e o
terapeuta. Segue, de forma literal, as falas das clientes.
Cliente 1, fala da filha que ela diz não querer ver mais.
“...eu não estou
errada...”
“...Fiz tudo o que
podia e o que não podia por elas...”
“...as duas dizem que
tiveram uma infância inesquecível, e aquela lá faz essas coisas...”
“...a gente ta tentando
fazer a nossa parte...”
“...eu nunca fiz isso,
eu nunca ensinei a ela esse tipo de coisa...”
“...todo o esforço que
a gente faz não valeu de nada...”
“...se ela for lá em
casa, ela vai me matar, matar meu marido, minhas filhas...”
“...durante a audiência
ela é cínica e irônica...”
“...eu sou uma bomba
atômica, pronta para explodir...”
Cliente 2, que chegou com atraso à sessão.
“...como muito
chocolate sozinha...”
“...tenho muita vontade
de comer, muita ansiedade de comer, mas depois me sinto mal...”
“...sempre que me sinto
mal, é porque antes eu havia comido muito...”
“...tomei vários
remédios para engordar...” Falando que anteriormente era magra e precisava
engordar.
“...eu não tenho
coragem de ir à academia...”
“...eu me acho muito
gorda...”
“...isso vai passar, eu
não sou gorda, eu apenas estou gorda, é só por causa da ansiedade...”
O terapeuta intervém: “E
que ansiedade é essa?”
A cliente 2 responde: “acho
que é por causa do meu namoro que tá muito chato...”
“...não to dormindo
bem...”
“...acho que meu
primeiro desequilíbrio é na minha casa...”
“...sinto uma falta de
realização profissiona...l”
- Pausa – (todos em silêncio)
Ela chora
Ela fala que o pai é alcoólatra.
“...a minha mãe é
aquele tipo de pessoa forte, que não demonstra sentimentos, é uma rocha, uma
pessoa firme em suas decisões...”
“...a história com o
meu pai, é uma história que não tem mais o que falar, ele agora só bebe uma ou
duas vezes por mês...”
Durante toda a sessão, a cliente 2 cobre o corpo com a
almofada.
“...eu sempre fui
linguaruda...”
“...eu me sinto uma
pessoa desonrada...”
“...quando eu era
criança, eu achava que podia matar a minha mãe...”
“...me sinto
deslocada...”
O terapeuta intervém: “Quando
você fala isso você sente o quê?”
Ela responde: “é uma
insatisfação grande, a gente se sente culpada o tempo inteiro...”
“...tento de tudo e
nada dá certo..” se referindo a uma profissão
“...tenho um gênio
muito forte desde criança...”
“...eu sempre fui muito
quieta, quando criança, em termos de fazer amizade...”
Falando para o terapeuta de sua empatia entre ela e ele: “...assim que eu vi o senhor eu gostei...”
“...eu não sei aprender
a gostar das pessoas...”
Esta cliente passa o tempo todo com os dedos na boca ou
escondendo a boca com as mãos.
O terapeuta intervém: “O
que você deseja?”
“...eu queria me sentir
realizada, mais feliz...”
Ela chora novamente.
A Cliente 1 a convida para aprender e fazer artesanato.
A Cliente 3, que participou pouco desta sessão, demonstrou
desejo de abraçar a Cliente 2, mas esta não aceitou.
Ela fala que o problema é com ela, e não com as outras
pessoas.
“...sempre fui de fazer
tudo que tive vontade...”
“...sempre tive vontade
de pintar e de cantar...” Ela se envergonha quando fala isso.
A Cliente 3 fala que acho a recusa do abraço normal, por
parte da Cliente 2, pois ela disse que já esperava este tipo de atitude dela,
pois ela sempre se mantém distante.
O Terapeuta intervém: “Você
é sincera consigo mesma?”
A Cliente 2 responde:
“Entendo ser sincera comigo...”
4. Análise dos Dados
As
experiências, motivações, expectativas e emoções influenciam o que é percebido.
Na fala da
cliente 1 emerge um conteúdo relevante e de muito significado para a ciência
psicológica. Quando a referida senhora manifesta: “ eu nunca fiz isso, eu nunca
ensinei a ela esse tipo de coisa” ( SIC), deixa transparecer que a educação da
filha foi precária e de nenhum sentido ético. A relação mãe e filha é
inconstante.
Outra fala
muito interessante é: “se ela for a minha casa, ela vai me matar, matar meu
marido, minhas filhas... ( SIC)” nessa fala a cliente deseja o oposto “se ela
não for a minha casa, ela não vai matar meu marido e minhas filhas” – “eu me
mato”
A todo tempo a cliente fala de si mesma como
na fala: “durante a audiência ela é cínica e irônica ... ( SIC)”
A cliente 1
apresenta comportamento de repulsa com a filha, mas na verdade ela reprime o
desejo de que essa relação com a filha podia dar certo.
Já no caso
da cliente 2 , tratá-se de uma pessoa com dificuldade de passagem de acordo com
Rogers, a cliente não consegue faze-la, como é percebido na fala: “eu não tenho
coragem de ir à academia” (SIC). Quando a cliente de um certo desequilíbrio que
há em sua casa, achamos que ela estar falando de si, pois essas desarrumação
seria em seu interior. A cliente 2 se
mantém em uma postura de empatia, mostrando um difícil convívio com demais
pessoas. Ela está em um processo de tendência atualizante, onde ela tenta sair
para uma condição diferente em que se encontra, e entrar em crescimento. A
cliente 2 também apresentou um convívio não muito bom com a família, como é
demonstrado na fala: “quando eu era criança, eu achava que podia matar a minha
mãe”(SIC) “me sinto deslocada”(SIC).
Tentamos perceber que a cliente não obteve um complexo de Édipo bem resolvido,
pois ela tem grande enfrentamento com o pai.
5. Considerações Finais
Percebemos a partir deste trabalho,
que o objetivo da observação é bem mais proveitoso e aprofundado do que parece,
além de ser essencial para os profissionais de psicologia. Durante as
observações, foi possível visualizar todos os processos básicos nas falas e nos
comportamentos dos clientes, sendo possível também co-relacioná-las com as
teorias psicológicas. Foi uma atividade muito proveitosa, e que nos trouxe alguns aprendizados práticos,
agregando saber ao nosso repertório teórico. Nesta experiência inicial, vimos
que observar não é algo superficial, e que há sempre alguma coisa por trás da
fala, que só é detectada com uma análise apurada e minuciosa. Vimos também,
como é importante o contexto onde esse cliente está inserido, sendo este um
fator extremamente importante para a análise da observação. Esperamos que no
decorrer do curso de psicologia, tenhamos mais oportunidades como esta, que nos
proporcionou dar o primeiro passo, rumo a uma formação de qualidade em
psicologia.
Referências
BRAGHIROLLI,
Elaine Maria, BISI, Paulo Guy, RIZZON, Luis Antônio & NICOLETTO, Ugo. Psicologia Geral. Porto Alegre: Editora
Vozes, 1990, cap. I, p. 10-29.
GOODWIN, C.
James. História da psicologia moderna.
São Paulo: Cultrix, 2005.
ROUDINESCO,
Elisabeth. Porque a psicanálise. Rio
de Janeiro: Jorge Zahar, 2000, cap. III, p.130-132.