A identidade numa Perspectiva Psicosocial


No sentido de precisarmos melhor o que entendemos por identidade, e qual a sua relação com conceitos da família do conceito ‘comunidade’, resolvemos apoiar-nos na obra “Social Identity”, de Naomi Ellemers, Russel Spears e Bertjan Doosje (Blackwell Publishers, Massachusetts, 1999 e 2000), autores mais conhecidos na psicologia social como NABERU ou a ‘escola de Amsterdão’ sobre identidade social. 

Os autores começam por salientar, na Introdução, que existem três níveis de análise que acentuam a perspectiva interaccionista e dinâmica que têm da identidade: 

1) Contexto: 

Conforme a audiência em presença (contexto comparativo: a importância dos outgroups particulares e a forma como o ingroup se compara a estes) aquando das ameaças à identidade do grupo, assim diferem as estratégias de defesa, ou seja, as respostas de relevo do ingroup que pareçam razoáveis e não violem definições consensuais da realidade social (não tendo tanta importância as convicções privadas quanto ao valor do grupo). 

Por outro lado uma visão consensual sobre as características do grupo [consenso interno ou geral?] parece limitar a facilidade dos membros em reclamar a superioridade deste. 


2) Compromisso: 

De acordo com a posição inicial de Tajfel e de Turner (1979) a identificação ingroup ou compromisso com o grupo (ligação a um grupo particular num contexto particular: uma variável individual num sentido cross-cultural) não deve ser vista só como uma variável de resposta que reflecte a atractividade do grupo de acordo com o status quo. De acordo com a teoria da auto-categorização (Turner, 1987) a identificação das pessoas com determinado grupo afecta a forma como lidam com a pertença a ele; isto determina o que vai ser sentido pelas pessoas como ameaçador (as suas percepções sociais) e as suas respostas a essas ameaças. Esta noção dinâmica de pertença permite perspectivar melhor as relações. 

Os altamente identificados protegem a imagem do grupo e esforçam-se por ele; os pouco identificados preocupam-se mais com a imagem pessoal e objectivos pessoais (o que não é moralmente condenável ou socialmente indesejável). Por exemplo grande coesão grupal em grupos que rejeitam normas mais pró-sociais pode fazer deles grupos socialmente perigosos. 

3) Conteúdo: 

O conteúdo da identidade define as dimensões das comparações sociais, que re-alimentam o conteúdo da identidade. 

Por outro lado existe também o conteúdo de normas específicas do grupo. Mesmo atitudes ou comportamentos que não sejam explicitamente reconhecidos como valores do grupo podem ser fontes relevantes de expressão de identidade, desde que sejam vistas como típicas ou características de membros de um grupo particular e guiem as atitudes e comportamentos dos membros. As atitudes vistas como características dependem igualmente do contexto social relevante e a forma como cada indivíduo as apresenta depende igualmente do seu compromisso para com o grupo. 



Fundamental na explicitação da convergência destes três níveis no conceito de identidade é o artigo “Algumas questões actuais na investigação sobre identidade social e teorias de auto-categorização” de John C. Turner. 

O autor começa por salientar que a teoria da auto-categorização veio apenas ampliar a teoria da identidade social, e que esta última é uma espécie de sucedâneo da teoria da dinâmica de grupos. 

O autor caracteriza do seguinte modo a evolução da perspectiva da identidade social: 

A ‘teoria da identidade social’ (Turner & Brown, 1978, para simplificar as várias definições de Tajfel) começou por ser utilizada para explicar a discriminação intergrupal no ‘paradigma do grupo minimal’ (Tajfel, 1972a; Turner, 1975, 1978b). Esse paradigma, construído por Tajfel, Flament, Billing e Bundy em 1971, defendia que a categorização social das pessoas em diferentes grupos produzia comportamentos intergrupais em que os sujeitos favoreciam os membros do ingroup sobre os do outgroup (Brewer, 1979; Turner, 1975, 1981; Turner & Bourhis, 1996). Era esta categorização social dos sujeitos que criaria uma identidade social para eles – a identidade social seria a parte do auto-conceito do self baseada na pertença a determinados grupos (Tajfel, 1979, p. 184). Era por a categorização social do grupo estar tão ligada à identidade social do indivíduo que este tinha uma motivação para uma identidade social positiva tentando reforçar a superioridade e distintividade do seu grupo. A noção central é que as comparações sociais entre grupos que fossem importantes para a identidade social produziam pressões para a diferenciação intergrupal no sentido de reforçar positivamente essa identidade ou ‘auto-estima colectiva’ (Crocker Luthanen, 1990). 

As atitudes e acções intergrupais dependiam da interacção entre a necessidade duma identidade social positiva e, a definição, percepção e compreensão da estrutura social das relações intergrupais por parte dos membros do grupo como colectivo (Turner 1996b, 1996c). As estratégias dos grupos para alcançar uma identidade social positiva são função do seu status, das suas crenças sobre a natureza das fronteiras do grupo, da intensidade da identificação ingroup e das suas ideologias colectivas e crenças estabelecidas sobre a natureza do sistema social e das diferenças intergrupais de estatuto, poder e riqueza. 


Tajfel (1979) identificou três aspectos da teoria: a análise psicológica dos processos cognitivo-emocionais que produziam uma necessidade para uma identificação social positiva; a aplicação desta análise a relações intergrupais reais; a hipótese do ‘continuum interpessoal-intergrupal’ (Tajfel, 1974, 1978a, ch.2). Este último seria um continuum do interpessoal para o intergrupal, em que no extremo interpessoal os sujeitos se relacionariam tendo em conta as relações e características pessoais e no extremo intergrupal se relacionariam tendo em conta as pertenças a determinados grupos ou categorias sociais. 

Consequências deste continuum eram: quanto mais intergrupal fosse um comportamento, mais uniformes eram as atitudes ingroup para com o outgroup, sendo que os membros do outgroup também eram vistos duma forma mais homogénea e indiferenciada da sua categoria social; pressupunha-se um jogo entre factores psicológicos e sociais; existiria uma distinção psicológica qualitativa entre comportamentos individuais e de grupo (o que levou Turner a pensar na relevância da identificação ingroup). 

Tajfel considerava que os membros de um dado grupo partilhavam uma ideologia quanto à ‘mobilidade social’ ou ‘mudança social’ e, consequentemente, quanto à rigidez da estratificação social (a que estaria ligada a percepção das fronteiras dos grupos e da impossibilidade duma acção individual ser insuficiente para mudar a situação social dos sujeitos). 

Os factores chave de mudança no continuum eram portanto a (im)permeabilidade das fronteiras dos grupos e o sistema de crenças quanto à mudança social. 

Isto já não acontece na teoria da auto-categorização, em que se dá mais relevo à identificação ingroup e à importância relativa dessa identificação num contexto social específico (Ellemers, Spears & Doosje, 1977). Esta concepção aponta para distinções como as de self-concept ‘stored’ [armazenado?] e ‘working’ [em acção?] (Markus & Wurf, 1987; Turner,1982). E também para a importância de como a identidade social se torna ‘salient’ [relevante?] (Oakes, 1987). 

Torna-se portanto necessário perceber como é que a teoria da auto-categorização veio alterar as ideias de Tajfel. 

A distinção, até agora inexistente, entre comportamento interpessoal e intergrupal levou à concepção duma distinção entre identidade pessoal (auto-definições em termos de atributos pessoais ou idiossincráticos) e social (auto-definições em termos de pertenças a categorias sociais) (Turner, 1978a, 1982, 1984). Isto levou a reflectir nas variações situacionais de funcionamento do self-concept (a dita ‘salience’) levando a concluir que: ‘The adaptative function of social identity...is to produce group behaviour and attitudes...[and] it is the cognitive mechanism which makes group behaviour possible.’ (Turner, 1984, p. 527). 

O processo que se encontra aqui postulado é a auto-categorização (self-categorization), levando à auto-estereotipação (self-stereotyping) e à despersonalização da auto-percepção (self-perception). A auto-categorização é uma ‘cognitive redefinition of the self – from unique attributes and individual differences to shared social category memberships and associated stereotypes’ (Turner, 1984, p. 528). Há uma maior percepção entre o self e o ingroup e um maior afastamento entre o ingroup e os outgroups. ‘The identity perspective...reinstates the group as a psychological reality and not merely a convenient label for describing the outcome of interpersonal processes and relations’ (Turner, 1984, p. 535). A identidade social foi reconceptualizada como o processo que transforma a identidade interpessoal em intergrupal. 

Subsequentemente manteve-se a noção de que identidades pessoais e sociais relevantes podem ter efeitos opostos na auto-percepção, produzindo, respectivamente, personalização e despersonalização. Mas considerou-se que, em vez dum continuum bipolar, ambas as identidades representavam diferentes níveis de inclusividade da auto-categorização, nem sempre opostas ou inversamente relacionadas, podendo mesmo situacionalmente apresentarem-se ambas como relevantes para a auto-definição (Turner, 1985;Turner, Hogg, Oakes, Reicher & Wetherell, 1987; Turner & Oakes, 1989). No entanto, apesar das forças que determinam a relevância dos diferentes níveis de auto-categorizaçãos não terem de ser inversamente relacionadas, não deixam de poder ser percepcionadas como tal, visto serem percepcionadas como trabalhando umas contra as outras, de acordo com a sua força relativa. 

Esta teoria pressupõe que a auto-concepção reflecte a auto-categorização (o agrupamento cognitivo do self como igual à soma de uma dada classe de estímulos e não de outros; este agrupamento respeita, como todas as categorizações, classes de maior ou menor inclusividade relativa). Turner refere que as categorias do self podem ser mais ou menos inclusivas que as de identidade social ou identidade pessoal, mas que são estes os níveis mais importantes para o estudo do comportamento de grupo (itálico nosso). A hipótese central para o comportamento de grupo é que à medida que a partilha da identidade social se torna relevante, a auto-percepção individual tende a despersonalizar-se (“Depersonalization of the self is the subjective stereotyping of the self in terms of the relevant social categorization.”, p. 12, sublinhado nosso, para acentuar que a despersonalização não deixa de ser um efeito subjectivo, do self). “Psychologically, the social collectivity becomes self.” (p. 12). 

A identidade pessoal refere-se a categorias do self que definem o indivíduo como único em termos das suas diferenças individuais dos outros (dos do ingroup); a identidade social refere-se à categorização social do self e dos outros (similaridades e contrastes com membros de certas categorias sociais). A identidade social é o self socialmente categorizado; é mais inclusiva ao nível da auto-percepção do que a identidade pessoal (tem mais inclusividade, como ‘cientista’ é mais inclusivo que ‘biólogo’). 

Esta teoria explica as variações na relevância de um dado nível de auto-categorização como função da interacção entre a relativa acessibilidade de uma dada categoria do self (“or ‘perceiver readiness’, the readiness of a perceiver to use a particular categorization”, p. 12) e a adaptação entre especificações categoriais e a realidade estímulo a ser representada (o encontro entre a categoria e a realidade). A acessibilidade relativa depende da experiência passada, expectativas presentes e motivações, valores, objectivos e necessidades actuais da pessoa (é a selectividade activa do percepcionador). A prontidão para usar uma determinada categoria social para a auto-definição depende muito da identificação com o grupo: se este é central, valorizado e egoenvolvedor (p. ex. Doosje Ellemers, 1997; Gurin & Markus, 1988). 

Já a adaptação entre as categorias e o real tem dois aspectos : 

1) uma adaptação comparativa [que parte do principio do meta-contraste (Turner, 1985): uma colecção de estímulos tem mais tendência para ser considerada uma entidade se as diferenças médias percebidas entre eles forem menores que as diferenças entre eles e os restantes estímulos que fazem parte do mesmo quadro de referência – “... a focal category against a contrasting background...”, p. 13; “...meta-contrast contextualizes categorization, tying it to an on-the-spot judgement of relative differences.”, p. 13; a categorização seria altamente variável e dependente do contexto, assim como as percepções das similaridades e diferenças] 

2) e uma adaptação normativa (Oakes, 1987) [o aspecto de conteúdo do encontro entre as especificações categoriais e as instâncias representadas; diz mais respeito às crenças normativas quanto ao significado social substantivo de uma dada categoria social (Oakes, Turner & Haslam, 1991; Turner, Oakes, Haslam & McGarty, 1994)]. 



A auto-categorização transforma subjectivamente as relações interpessoais em similaridades e diferenças, daí se seguindo percepções de atracção e de antipatia, acordo e desacordo, cooperação e conflito. “Self-categorization is assumed to provide the fundamental basis of our social orientation towards others.”, p. 14. 

Turner resume as ideias chave no seguinte: 

- o nível e tipo de identidade usado para representar o self e os outros varia de acordo com as suas motivações, valores e expectativas, o seu conhecimento de base e o contexto social em que a comparação tem lugar; 

- a relevância das identidades sociais partilhadas leva à despersonalização da auto-percepção; 

- a despersonalização produz o comportamento de grupo (ou seja, acção colectiva e processos regulados por um self categorial socialmente partilhado). 

Turner centra-se em seguida nas implicações e críticas da perspectiva da identidade social. 

A perspectiva da identidade social, afirma o autor, teve como consequências principais o renovar de certas problemáticas da psicologia social, como a relação indivíduo-grupo, os processos de grupo, a questão do preconceito e das relações intergrupais, a estereotipação social, o auto-conceito e a personalidade. Chamou-se 'interacionismo' à metateoria psicosocial por detrás da identidade social. 

Quanto á nova forma de pensar os grupos: 

"The fundamental principle that follows from self-categorization theory is that psychological group formation is an adaptative process that produces socially unitary, collective behaviour and makes possible group relations of mutual attraction, cooperation and influence between menbers.", p. 14. A formação grupal não é um mero efeito das relações inter-pessoais, muda-as qualitativamente. Quando o grupo se forma enquanto identidade psicológica as pessoas não se ligam tanto por atracção interpessoal quanto por percepção identitária mútua das similaridades do grupo. 

As pessoas tendem a agir mais se partilham uma identidade social saliente, sendo que esta é acompanhada de uma despersonalização da percepção do self e dos outros. Esta despersonalização do self é acompanhada duma despersonalização dos interesses do self, transformando-os em interesse do grupo-nós (we-group), criando assim uma orientação cooperativa. 

Aumentam igualmente as expectativas de consenso, sendo que, quando ele não existe o indivíduo dissidente se interroga porquê (há um processo de validação subjectiva conforme se participa ou não na norma do ingroup); e quando ele existe é tomado como resposta a um estímulo externo objectivo, como a resposta a que 'a realidade obrigava'. O comportamento normativo é tido subjectivamente como informativo da realidade, e não meramente convencional (e, quanto mais consensual mais tido como informativo, objectivo). 

Quanto mais prototípico do ingroup for um dado indivíduo, quanto mais representar o consenso desse grupo, quanto mais representar o grupo como um todo, mais influente é e mais líder pode ser. Variando o contexto social de comparação da identidade social do grupo pode variar também a influência das minorias nele, e conversões podem ocorrer. As minorias extremistas tendem a ser vistas como outgroup nas comparações intragrupais e como ingroup nas comparações intergrupais. Sendo que estas comparações acontecem conforme as situações, a influência das minorias depende também do contexto social. 

A interdependência situacional entre as pessoas tanto pode ser uma causa como um efeito da formação psicológica do grupo. Qualquer variável que possa funcionar cognitivamente como critério de categorização social pode levar à formação do grupo. 

Quanto a uma nova forma de pensar as relações intergrupais e o preconceito: 

São as relações intergrupais que determinam as atitudes intergrupais. Estas são sempre o resultado da interacção entre a psicologia colectiva das pessoas enquanto membros de grupos e a estrutura social percepcionada das relações intergrupais (esta interacção é mediada pela compreensão socialmente partilhada e construída das relações intergrupais - portanto pelas crenças, teorias e ideologias colectivas sobre a natureza do sistema social e a natureza das diferenças de estatuto entre os grupos); o self não é meramente pessoal. 

O preconceito não nasce duma psicologia individual irracional e/ou patológica. Ele nasce duma forma que é psicologicamente significativa para as pessoas, pois nasce da sua definição social, da sua compreensão da realidade social e das relações intergrupais. "It is [o preconceito] a result of ordinary, adaptative and functional psychological processes in interplay with the realities of social life.", p. 19. Não existe nos grupos qualquer tendência irracional, independente da realidade social e da sua compreensão, para o etnocentrismo, por exemplo. 

Por outro lado, a perspectiva da identidade social defende uma descontinuidade psicológica entre a acção da pessoa enquanto indivíduo e a acção enquanto membro de um dado grupo. A identificação não é saliência (a saliência é social). "Where one makes a strong intergroup comparison and one's shared social identity becomes salient, intergroup attitudes are likely to become depersonalized, consensual and normative.", p. 21. E isto mesmo que previamente existam muitas diferenças individuais intragrupalmente. 

Sendo a saliência efeito duma cognitividade social, é normal que as identificações com o ingroup variem para a mesma pessoa, pois podem variar também a auto-categorização e outros processos de identidade social num dado cenário. 

Isto não significa que as várias identificações sejam indiferentes ou insignificantes; elas são a medida da prontidão do indivíduo determinadas categorias do self em termos de identidade, reflectindo como é que aquela pessoa compreende e constrói as categorias do self num dado cenário. Essas categorias reflectirão a centralidade ou não de uma dada pertença de grupo para esse indivíduo, assim como a compreensão que essa pessoa tem do lugar desse grupo na ordem social. “The mistake is to think that identification expresses some kind of fixed and stable self-structure or personality trait which is cronically salient and directly expressed independently of the social meaning of the situation. If we think of identification as measured in some relevant context as providing information about the different readiness of people to use certain social categories, then it becomes evident that it will be an important variable with relevance for predicting a whole range of effects.”, p. 23, sublinhado nosso para evidenciar a não estaticidade do processo de identificação. Por exemplo, considera-se que os indivíduos altamente identificados com o ingroup tendem a agir mais em termos de ‘mudança social’, enquanto que os pouco identificados tendem a agir em termos de ‘mobilidade individual’. 

Há que salientar que o ingroup bias ou competição social é só uma das formas de alcançar distintividade positiva, sendo as outras a mobilidade individual e a criatividade social. Esta distintividade é social, colectiva (tenta projectar positivamente a identidade social partilhada), não individual, ao nível da estima. Rubin e Hewstone (1988) distinguem entre auto-estima ‘social’, ‘específica’ e ‘de estado’ e, por outro lado, auto-estima ‘pessoal’, ‘global’ e ‘de traço’. Estas duas auto-estimas são função de diferentes níveis de auto-categorização (que, por sua vez, dependem de comparações sociais no contexto dos valores e ideologias dos grupos). No caso dos processos de identificação social “What matters is status position in interaction with the perceived nature of status differences.”, p. 24. 

Quanto a uma nova forma de pensar a estereotipação: 

A estereotipação não resulta dum procedimento cognitivo errado ou simplista. “Self-categorization theory argues that stereotypes are social categorical judgements, perceptions of people in terms of their group memberships. They represent categorizations at the level of social identity, in which people are defined in terms of the characteristics of the group as a whole in the context of intra-and intergroup relations. They are fluid, variable and context-dependent. A stereotype of the same people may vary in categorical level, kind, content and prototypical meaning as a function of the relationship between self and others, the frame of reference, the dimensions of comparison and the background knowledge, expectations, needs, values and goals of the perceiver (Haslam, Turner, Oakes, McGarty & Hayes, 1992; Haslam & Turner, 1992, 1995, 1998; oakes, Haslam & Turner, 1994; Oakes & Turner, 1990; Spears, Oakes, Ellmers & Haslam, 1997; Turner & Oakes, 1997; Turner, Oakes, Haslam & McGarty, 1994).”, p. 26. 

“Social groups and collective relationships exist as much as do individual personalities and individual differences. (...) Stereotypic accentuation reflects the rational selectivity of perception in which it is more appropriate to see people in some contexts at the level of social category identity than at the level of personal identity. It is no more a distortion to see people in terms of their social identity than in terms of their personal identity. Both are products of the same categorization processes.”, p. 26. 

A forma positiva como é vista a capacidade de estereotipar é ainda acentuada da seguinte forma: “Group life is not based on a cognitive distortion of the self and prejudice; it is, in Asch’s words, one of ‘the two permanent poles of all social processes’ (1952, p. 251) and is an authentic expression of self. (...) much of the plausibility of the ‘cognitive miser’ metaphor of social cognition has rested on the dominant view of categorization and stereotyping as over-simplification. Self-categorization theory argues that this view is false. It is not necessary to assume that people have limited information-processing capacity to explain why people stereotype. Stereotyping does not empoverish, but enriches social perception, since it captures one of the two poles of human social behaviour (...). It reflects important aspects of social reality and is meaningful, explanatory, theory-laden, with content derived from people’s complex higher-order beliefs about the nature of intergroup relations (Tajfel, 1969, 1981b).”, p. 27. 

O estereótipo é portanto dinâmico e sempre mediado pelo contexto social; e só aparenta ser rígido quando, erradamente, se espera que ele se altere devido a informações sobre características de nível individual dos membros do grupo estereotipado. 

Quanto a uma nova forma de pensar o self e a personalidade 

“The nature of the self and its relationship to cognition is at the theoretical core of social psychology (Turner & Oakes, 1997). (...) It is the fact of self which makes human cognition social cognition. It is the self-process which is the dynamic principle which acts to internalize society as part of cognitive functioning. (...) the self is ‘a mechanism for the social determination of cognition, for translating variation in one’s “social place” into relevant “cognitive choice”’ (Turner, Oakes, Haslam & McGarty, 1994, p. 462). What we mean by ‘cognitive choice’ is the selective representation of phenomena from the vantage point of the perceiver.”, p. 28. 

O self não é uma estrutura fixa. “(...) self-categorizing varies lawfully and systematically (in level of inclusiveness, specific kind of self-category at each level, comparative attributes and relative prototypicality of instances) so as to express the varying, reflexive representation of the perceiver which is inherently fluid and flexible because it is a comparative, relational judgement. It defines the individual in a social context or, if one prefers, it defines the individual in social relational terms.”, p. 29. 

Concluindo “(...) self-categorizing provides a varying social definition of the perceiver, and (...) the varying, socially defined self actively shapes and determines cognition by directing its functioning from the specific vantage point of a given self.”, p. 29. “All cognition, including basic processes such as categorization, takes place from a specific vantage point, a singular perspective: that of the self currently salient.”, p. 30. 

Desta forma “(...) it is the socially variable self that transforms cognition into social psychology [e a psicologia social em cognição afectiva, porque relacional].”, p. 30. 

Quanto à relação com a questão da personalidade, o autor afirma: “Self-categorizing theory argues that the self is not based predominantly on personal identity, but varies in level and includes collective identities, reflecting group memberships and collective similarities, that actively depersonalize self-perception. Social identities are not idiosyncratic but under appropriate conditions, can be shared and highly normative (Haslam, Turner, Oakes, McGarty & Reynolds, 1998) and produce relatively unitary, collective behaviour when salient. Further, social identity is not personal identity as reflected in the looking-glass of social interaction, but is a subjective collective identity which includes others defined as ingroup members [razão pela qual “(...) the dimensions and attributes of personal identity will vary with the ingroup contexts and the level of the social identity that provides the frame of reference. It is not universalistic.”, p. 31]. Finally, social identities and other self-categories arise from an active process of judgement and meaningful inference, in which they are constructed from an interaction between motives, expectations, knowledge and reality, rather than being passive activations of a fixed self-structure.”, p. 30/1. 

Daqui não se deduz que o self viva à deriva, alerta o autor. “(...) the analysis is not arguing against the stability of self-categories as an empirical fact or possibility. It is not saying that self-categories vary chaotically, whimsically. The same general processes that predict variation under some conditions also predict stability under others. Self-categorizing is an active, interpretative, judgemental process, reflecting a complex and creative interaction between motives, expectations, knowledge and reality, but the outcomes can still be similar and stable.”, p. 31. “Stability of self-categories across time is assumed to reflect the stability of the perceiver factors and judgemental conditions which interact to produce them, and is restricted to conditions which are invariant in these respects. One does not need the concept of a fixed underlying self-structure to explain why and when self-categories may be stable.”, p. 32, conclui o autor.



 Cristiano Lima