Você frequentemente se encontra lutando contra
sentimentos dolorosos ou difíceis?
Por exemplo:
- Raiva
ou frustração tão intensas que você sente que está prestes a
explodir?
- Tristeza que
parece que irá lhe esmagar e puxar para o fundo do poço?
- Ansiedade
ou culpa que lhe impedem de se engajar em atividades que são
importantes para você?
Você já tentou de todas as maneiras se livrar desses
sentimentos desagradáveis, mas de alguma forma eles simplesmente continuam
aparecendo?
Se você é um ser humano, então sua resposta a essas questões
vai ser, muito provavelmente, sim. Goste ou não, sentimentos
difíceis/dolorosos são uma experiência humana universal e a
maioria de nós se encontra lutando contra ou tentando se livrar desses sentimentos com
uma certa regularidade. Na cultura ocidental, parece que somos
frequentemente encorajados a encarar sentimentos dolorosos como uma
espécie de aberração – um inconveniente a ser evitado tanto
quanto for possível, um sinal de que há algo errado conosco, uma doença
que precisa ser curada, uma irritação a ser abafada por uma variedade infinita
de distrações. Existe um pressuposto não-declarado de que
felicidade significa sentir-se bem o tempo todo e, se não estamos
nos sentindo bem, concluímos então somos defeituosos de alguma forma –
talvez não estejamos tendo pensamentos positivos suficientes, ou não sejamos
atraentes o suficiente, ou populares o suficiente, ou talvez apenas
precisemos aderir ao modismo da hora ou adicionar mais alguns amigos em nossa
conta do Facebook… e assim por diante.
Infelizmente, nossos esforços para evitar ou nos livrar
de sentimentos desagradáveis tendem a ser um tiro pela culatra e, no fim
das contas, geram mais sofrimento. Para dar um exemplo óbvio, um
viciado irá usar drogas, álcool, jogos, pornografia, etc. para tentar se livrar
dos sentimentos dolorosos – e isso funciona por um curto período, mas
então ele acorda no dia seguinte e os sentimentos dolorosos estão de
volta, geralmente piores do que no dia anterior, então ele consome um
pouco mais de álcool/drogas/etc. e assim o ciclo da dependência
continua em uma espiral descendente.
Um exemplo menos óbvio são os transtornos de
ansiedade. Não há nada fundamentalmente patológico em relação ao
sentimento que chamamos de ansiedade – na verdade, ansiedade é
uma resposta humana normal a qualquer situação em que nos
encontramos “fora de nossa zona de conforto”, e potencialmente expostos a
alguma forma de perigo. A ansiedade apenas se torna um transtorno quando
decidimos que os sentimentos ansiosos, em si, são de algum modo errados,
ruins ou perigosos, e começamos a usar diferentes tipos de estratégias
(por exemplo: não sair de casa, lavar as mãos constantemente, usar álcool,
nos distrairmos excessivamente) para evitar esses sentimentos. Então
sempre que um sentimento de ansiedade aparece, ficamos ansiosos devido ao
fato de estarmos nos sentindo ansiosos… percebe o ciclo vicioso?
Uma maneira mais produtiva de lidar com sentimentos
difíceis é vê-los como “mensageiros” – como um sistema de alarme,
primitivo e construído pela evolução, que nos alerta sobre o fato de que
algo “não está certo” com o nosso mundo e que uma ação imediata talvez
seja exigida para enfrentar a situação! As emoções também podem servir
para nos lembrar do que realmente valorizamos em relação a uma situação em
particular ou à vida em geral. A tabela a seguir ilustra brevemente esse
conceito:
Emoção/Sentimento
|
Gatilho/Mensagem
|
Valor/Ação
|
Tristeza
|
Uma perda significativa
|
Cuidado/compaixão consigo mesmo e com outros;
Necessidade de se ajustar e se adaptar à perda
|
Raiva
|
Dano ou injustiça
|
Proteger a si mesmo ou a entes queridos; Necessidade
de lutar por seus direitos
|
Ansiedade/Medo
|
Perigo – real ou percebido
|
Se o perigo for real – defender-se ou fugir!Se o
perigo for percebido, parar por um momento para considerar
respostas adequadas!
|
Culpa/Vergonha
|
Um erro ou mal foi cometido
|
Refletir sobre e aprender com o evento; Pedir
desculpas?; Fazer melhor na próxima vez!
|
Nojo
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Algo tóxico/contagioso
|
É necessário cuidado; garantir a segurança!
|
Contudo, nem sempre é fácil interpretar a mensagem e,
algumas vezes, sentimentos dolorosos parecem vir do nada. Nesses
casos, pode ser útil simplesmente ver os sentimentos como “eventos
climáticos internos”; alguns dias são ensolarados e quentes; alguns dias são
frios, úmidos e deprimentes – nós não tentamos mudar o clima (é inútil!),
nós simplesmente o reconhecemos e ajustamos nosso comportamento conforme o
necessário (por exemplo: pegamos um guarda-chuva ou passamos protetor
solar), sabendo que inevitavelmente o evento climático irá
passar, seguindo seu rumo natural.
Um pré-requisito básico para lidar efetivamente com
sentimentos difíceis é cultivar a habilidade de se distanciar mentalmente
do sentimento e simplesmente observá-lo, para que possamos interpretar a
mensagem e tomar a atitude apropriada, ao invés de simplesmente
se deixar levar por uma enxurrada de emoções e se acabar se comportando de
forma potencialmente destrutiva. Na psicologia moderna, essa
habilidade de se distanciar e observar experiências internas é conhecida
como mindfulness (atenção plena). Pesquisas
científicas recentes mostraram que praticar regularmente
exercícios simples de mindfulness pode
melhorar significativamente nossa habilidade de lidar efetivamente com
sentimentos difíceis. Veja a seguir um exercício simples de mindfulness
chamado “N.A.M.E. it to Tame it” (Nomeie-o para amansá-lo).
O acrônimo N.A.M.E representa: N-Notice (Perceba),
A-Acknoledge (Reconheça), M-Make room (Dê espaço), E-Expand awareness
(Expanda a consciência)
Passo 1: Perceba: – Perceba onde o sentimento
doloroso está localizado – garganta? peito? abdômen? outro local? em
vários lugares? Agora foque sua atenção na parte do corpo onde
o sentimento é mais intenso e intencionalmente observe a sensação, como se
você fosse um cientista curioso que nunca havia encontrado um sentimento
como esse antes. Perceba quaisquer características, como movimento,
pressão, temperatura, vibração, pulsação. O sentimento tem um “sabor”, por
exemplo, medo, raiva ou nojo? Enquanto você faz isso, sua mente certamente irá
tentar distrai-lo com pensamentos como “Eu odeio esse sentimento”, “Eu quero
que isso vá embora”, etc.; quando isso acontecer, simplesmente agradeça
sua mente por esse comentário interessante, e retorne sua atenção para
sensação.
Passo 2: Reconheça: – Use algumas palavras para
reconhecer o sentimento. Talvez diga para si mesmo “Eu estou notando um
sentimento de ansiedade/raiva/nojo/etc.”. Tente fazer isso com compaixão e
sem julgamentos. Note qualquer ímpeto de julgar, criticar, lutar ou se livrar
do sentimento; procure deixar esse ímpeto ir e vir, e permita que o sentimento
seja como é. Se você tem a sensação de que este sentimento está lhe
transmitindo alguma mensagem (vide exemplos na tabela anterior), pare um
momento para reconhecer que mensagem pode ser essa. Tente colocar a palma
da sua mão, com compaixão e gentileza, sobre a área dolorosa: na maioria
das vezes, isso é reconfortante.
Passo 3: Dê espaço: – Por alguns segundos, mude
a sua atenção para a sua respiração. Inspire profundamente e devagar, duas
ou três vezes, mexendo sua barriga, não o seu peito. Então, enquanto você
faz a próxima inspiração, dirija a respiração para dentro e por volta daquele
sentimento intenso que você vem observando. Você pode interpretar esse
processo da maneira que desejar – apenas tente imaginar que, de alguma
forma, você está respirando para dentro e ao redor da sensação.
E, enquanto você faz isso, de uma maneira mágica, um grande espaço está se
abrindo dentro de você. Então, em vez de reprimir, esmagar ou comprimir o
sentimento, você faz exatamente o oposto e se abre, dando muito espaço
para o sentimento. Você não precisa gostar do sentimento,
você simplesmente permite que o sentimento esteja lá e abre espaço para
ele. Pode ajudar tentar imaginar que o sentimento é como um inseto com
asas (talvez uma vespa?) que está agitado e zumbindo alto por estar em um
espaço confinado. Contudo, a cada inspiração, você está enchendo um grande
balão ao redor do inseto, dando ainda mais espaço para que ele voe, de
modo que ele fique muito menos estressado e e com menos vontade de picar
alguém!
NOTA: se você achar que respirar para dentro do
sentimento é muito difícil ou não está ajudando, então apenas continue a
respirar, devagar e profundamente, movimentando sua barriga, e não o seu peito.
Passo 4: Expanda a consciência: – Agora você
pode permitir que sua consciência se expanda gradualmente, de modo que
você não repare apenas o sentimento, mas perceba gradualmente o resto do
seu corpo e tudo o que você pode ouvir, ver, sentir, tocar e cheirar.
Alongue-se gentilmente, solte seu corpo, e torne-se consciente daquilo que
está a sua volta. Perceba que você pode estar ciente do sentimento
doloroso e, ainda assim, estar também ciente do resto de sua experiência. Agora
você pode decidir que atitude tomar, baseado em seus valores pessoais e
não controlado por suas emoções!
Por favor, note: – Apesar de frequentemente as
pessoas sentirem que esse exercício reduz a intensidade do
sentimento doloroso, isso nem sempre ocorre e não é o propósito do
exercício. O objetivo é cultivar uma consciência plena em relação aos
sentimentos dolorosos, para que não sejamos esmagados por eles e para que
possamos tomar uma atitude efetiva para melhorarmos nossas vidas, mesmo na
presença de sentimentos difíceis.
Instrumento desenvolvido por Kingsley Mudd
(http://contextualscience.org/)