RESUMO
A Psicologia das
Instituições e Organizações Sociais remete-nos a um estudo aprofundado das
mesmas através de vários elementos metodológicos (entrevistas, visitas e
discussões em sala de aula) assim, exercemos uma articulação clara com a
disciplina de Prática Integrativa IV. Fazemos uma breve retrospectiva
histórica, remetendo-nos à ascensão do Estado moderno e todas as suas
configurações. Baseando-se nas teorias de Goffman, Freud, Focault, Lapassade,
Deleuze e Bleger, alguns conceitos como a transferência e a contratransferência
encaixam-se perfeitamente nas nossas entrevistas com os colaboradores da
instituição. Percebe-se no decorrer do desenvolvimento deste trabalho a
importância dos psicólogos dentro de uma instituição e como a psicologia
encaixa-se em vários contextos, tendo sempre uma responsabilidade para com o
social, zelando pelo bem-estar do mesmo.
Palavras-chave: Psicologia Institucional, Instituição,
Autismo.
Este artigo foi escrito a partir da demanda da disciplina de Psicologia,
Instituições e Organizações Sociais e têm como objeto de estudo as instituições
baseado nas teorias de Goffman, Focault, Lapassade, Deleuze, Freud e Bleger.
A Casa da Esperança, situada no bairro Edson Queiroz, em Fortaleza -
Ceará, onde encontramos crianças e jovens de todas as classes, foi a escolhida
para aplicarmos esta pesquisa. É um local onde as pessoas que sofrem de autismo
podem desenvolver suas habilidades, através de atividades cognitivas e
intelectuais recebendo também o apoio de uma equipe multidisciplinar
(psicólogos, terapeutas ocupacionais, fonoaudiólogos, fisioterapeutas etc.) .
Estabelecemos como problema entender o funcionamento dessa instituição e
de todas as normas/regras que a compõem pretendendo, assim, conseguir um ótimo
resultado de estudo através da articulação das cadeiras Psicologia das
Instituições e Organizações Sociais e Prática Integrativa IV, aliando a teoria
institucional aos estudos etnográficos.
A metodologia de estudo utilizada
foi aulas teóricas e discussões em sala de aula, aliadas às visitas à
instituição escolhida e entrevistas com alguns colaboradores dentro das
dependências da mesma.
A escolha da instituição deu-se
através do interesse de estudar e compreender as pessoas diagnosticadas como
autistas, de entender a formação da mesma, seus objetivos e como podemos
avaliar as divisões de tarefas dentro dessa instituição. As expectativas são
que, através deste artigo, possamos compreender a articulação da teoria com a
vivência, tornando claras e objetivas as idéias da articulação das duas
disciplinas citadas acima.
A CASA DA ESPERANÇA
Fazendo uma breve retrospectiva histórica vemos que o século XVIII é
marcado por grandes mudanças: a emergência do Estado moderno, a modernidade
passa a ser unificadora das comunidades, o capitalismo surge como algo liberal
fazendo, assim, com que o poder não esteja concentrado apenas na nobreza e que
a ascensão social seja possível para qualquer um.
O Estado moderno muda a lógica do regime absolutista tornando, assim, o
indivíduo efeito e alvo dos investimentos deste Estado. O teocentrismo “dá
lugar” ao antropocentrismo, colocando o homem no centro de tudo. Surgem novas
idéias que virão a acabar com a noção de uma verdade única, rompendo com o
pensamento cartesiano, colocando em cena a razão. Aparece então o conceito de
nominalismo (“a existência precede a essência”) que virá a ser exatamente o
contrário do pensamento platônico.
A partir destas mudanças surge o conceito de modo-indivíduo de
subjetivação, passamos a nos submeter ao saber atual, tornando-nos sujeitos do
conhecimento. Surgem, assim, as novas normas/regras que incidem sobre um corpo
individual. Neste ponto histórico a medicina passa a pensar o social como um
corpo, surgindo as normas higiênicas e a população é esquadrinhada (analisada,
classificada e distribuída).
Para Focault a modernidade faz aparecer o duplo: o homem torna-se objeto
de estudo da ciência, ou seja, o homem passa a estudar ele mesmo. O eu torna-se
uma interioridade (privada, íntima e individual), trazendo consigo uma nova
noção de subjetividade. Surge a necessidade de estudar e entender essa “nova”
subjetividade, fazendo com que o século XIX seja o marco do nascimento da
psicologia.
Tomando neste momento como base a teoria de Goffman, a Casa da Esperança
não se configura em uma instituição total, categoria trabalhada por ele. Este
fez um trabalho de inspiração etnográfica em várias instituições e considerou a
categoria Instituição Total aquelas que têm um caráter fechado, de
enclausuramento, sem trânsito entre o mundo externo e o mundo interno da
instituição, havendo no ato admissional uma mortificação do eu.
A Casa da Esperança não experimenta este modelo de instituição por ter um
caráter aberto, de escola. As crianças vão à mesma diariamente, visando o
desenvolvimento cognitivo e intelectual através das diversas atividades, tendo
bastante contato com o mundo externo, não sendo um hospital para autistas,
descaracterizando assim uma Instituição Total.
Sob o ponto de vista Foucaultiano, a Casa da Esperança é uma instituição
disciplinar, na medida em que usa técnicas de exame, distribuição,
classificação para normalizar o autista. É aplicada uma tecnologia de
poder/saber que é exercido nos corpos dos alunos para torná-los úteis e dóceis.
Freud entende que o objetivo das instituições sociais é a regulação
social ou dizendo de outro modo, a proteção do homem contra o próprio homem.
Sob esta égide, a Casa da Esperança é uma mediadora necessária que acolhe a
diferença (ser autista) e protege estas pessoas de uma sociedade incompreensiva
com instintos primários latentes, podendo a agressividade imperar contra as
mesmas.
Lapassade trabalha com conceitos como burocracia e poder. Na Casa da
Esperança a quota de burocracia é pequena, haja vista a facilidade que encontramos
para agendamento e acesso a todas as salas de aulas, não foi exigido ofício de
apresentação e houve uma grande disponibilidade de nos informar sobre todo
trabalho que a escola oferece. Durante uma entrevista com a funcionária Lurdes,
esta nos conta da facilidade de conversar com a equipe dirigente, diz que todos os funcionários têm acesso aos
diretores e estes têm muito respeito para com sua equipe.
Bleger fala de uma proposta de fazer a Psicologia sair dos consultórios
(limites terapêuticos) para abarcar a realidade cotidiana e esse trabalho
realizado pelo psicólogo deve ser feito com uma intervenção investigadora.
Percebemos a partir da fala de Bleger que exercemos bem este trabalho durante
nossas visitas à instituição, pois chegamos à Casa da Esperança sem o mínimo de
conhecimento sobre a mesma e tivemos que estudar, associar e interpretar todas
as novas informações e detalhes da instituição.
O cenário era completamente desconhecido, não tínhamos certeza de nada
que encontraríamos e de como seríamos recebidos. Nossa ansiedade era tamanha,
pois um trabalho realizado por um desconhecido com tanta minuciosidade assim,
poderia vir a assustar. Comprovamos isso exatamente na fala do Dr. Alexandre
Costa, psicólogo e diretor técnico da instituição, que veio a ficar surpreso
quando soube que estávamos investigando “sua” instituição, ficando tão curioso
ao ponto de ceder-nos uma entrevista no mesmo instante.
Bleger, baseado na sua linha de pensamento psicanalítica, fala que esta
investigação se torna possível por conta de dois pontos básicos que se chamam:
transferência e contratransferência. A primeira aborda uma repetição de
sentimentos e
fantasias do “sujeito a ser conhecido” e a relação com o seu “conhecedor”, ou
seja, acabamos por nos identificar com as experiências citadas pelo
entrevistado, durante o momento da entrevista. E a segunda, fala de uma
contratransferência que Bleger enfatiza dizendo: “o instrumento do trabalho do
entrevistador é ele mesmo e sua própria personalidade”, ou seja, apesar de nos
identificarmos projetivamente com a situação do entrevistado conseguimos
continuar em nosso papel diferenciado, ser entrevistador.
Bleger diz: “a “saída dos consultórios” não constitui apenas uma variação
do trabalho psicológico (uma forma diferente de se “fazer” Psicologia). É,
sobretudo, uma necessidade social.” A partir desta fala percebemos o quanto
nosso trabalho dentro de uma instituição é importante, pois uma simples
intervenção acaba gerando um grande resultado.
Outro conceito que destacamos durante a leitura sobre Bleger, é o da
Psicohigiene. Esta vem falar do trabalho do psicólogo, nas situações comuns da
vida das pessoas em torno de suas tarefas rotineiras, promovendo, assim, o
bem-estar.
Conseguimos entender este conceito claramente durante a observação do
trabalho dos psicólogos junto às famílias dos autistas. Pessoas vêm todos os
dias até a Casa da Esperança, buscando entender e familiarizar-se com essa
diferença de vida, sendo através do contato com os psicólogos que as mesmas
conseguem tomar um rumo, escolhendo assim o melhor caminho para cuidar de seus
familiares diferenciados.
Esse zelo pelo social também pode ser visto dentro da instituição através
das atividades que são direcionadas às mães e das oportunidades de trabalho que
são dadas dentro da própria instituição. Cuida-se assim, não só do autista, mas
de todo o ciclo que lhe cerca.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este trabalho trouxe-nos a oportunidade de observar como as nossas
características atuais têm relação com a ascensão do Estado moderno, com todas
as configurações que surgiram a partir do mesmo e a necessidade de se estudar
uma subjetividade, surgindo assim, a Psicologia.
Através do desenvolvimento deste artigo, pudemos observar toda a
interligação das teorias e, mesmos as mais diferenciadas, se completam no
estudo de uma instituição. Tivemos a oportunidade de vivenciar as rotinas e
desafios de uma família configurada de uma pessoa autista e aprender o quanto o
trabalho dos psicólogos é importante na rotina da mesma. Concluímos que o
compromisso de zelar pelo bem-estar humano é bem exercido dentro da instituição
estudada, pois a mesma cede às famílias a intervenção do trabalho psicológico,
na busca de uma melhor qualidade de vida para os autistas.
Conseguimos através de toda a articulação das práticas com as teorias
focar em nossos objetivos, obtendo uma ótima compreensão do tema, mesmo tendo
em vista várias formas de pensar.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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