O que é sociologia


 Texto: Martins,Carlos Benedito. O que é sociologia. 38ª.ed.São Paulo:Brasiliense,1994
Neste livro o autor procura relatar como surgiu, como foi a formação e o desenvolvimento da Sociologia e inicia fazendo referência ao século XVII i e suas conseqüentes mudanças na vida social (política, econômica e cultural), referindo o fim da sociedade feudal (sociedade estável), das autoridades feudais, o fim da tendência sobrenatural e dogmática de se explicar os acontecimentos, da família patriarcal, etc, e que fizeram eclodir duas grandes revoluções - a Revolução Industrial, na Inglaterra e a Revolução Francesa. Tais revoluções e suas transformações colocaram a sociedade em evidência.
Historicamente, a sociologia é um conjunto de conceitos, de técnicas e de métodos de investigação produzidos para explicar a vida social, assim, seu processo de formação foi agilizado na medida que situações sociais radicalmente novas exigiram uma investigação e analise com metodologia científica adequada, não apenas baseado em mitos, Filosofia e dogmas religiosos. Para tal havia debates ideológicos onde estavam presentes correntes conservadoras, liberais e socialistas, visando orientação de ações para conservar, modificar radicalmente ou reformar a sociedade de seu tempo.
O pensamento moderno estava em alta e para o racionalista Francis Bacon (1561-1626), a teologia deixaria de ser a forma norteadora do pensamento para dar lugar ao novo método científico de conhecimento baseado na observação e na experimentação sistemática e objetiva dos fatos. Segundo ele, dessa maneira seria também possível descobrir e formulas leis gerais sobre a sociedade. A Sociologia, então, foi se formando e se consolidando como se fosse uma resposta intelectual às novas condições de existência: a sociedade capitalista - que impõe uma reflexão sobre a sociedade, suas transformações, suas crises, e sobre seus antagonismos de classe.
A Revolução Industrial e o surgimento da sociedade capitalista (rápida industrialização e urbanização), resultaram em desintegrações de costumes e instituições:
ü Triunfo da indústria capitalista (avanço da tecnologia) e da classe minoritária detentora dos meios de produção e do capital, transformando os trabalhadores em despossuídos, onde deveriam submeter-se ao novo sistema onde havia normas trabalhista, longa e penosas jornadas de trabalho nas fábricas, salários de subsistência (proletariados) - a fim de satisfazer os interesses econômicos dos empresários.
ü O intenso êxodo rural culminou na explosão demográfica e na falta de infra-estrutura capaz de comportar os excedentes populacionais nas cidades industriais, gerando mudanças na estrutura das cidades industriais como o aumento da miséria, epidemias, suicídios, da prostituição e da criminalidade.
ü Destruição das máquinas e equipamentos pelos proletariados.
ü Formação dos sindicatos com o objetivo de se defender dos proprietários dos meios de produção e do próprio sistema capitalista vigente. Ao protestar e ao buscar mudanças, a classe operária se inclinava ideologicamente ao socialismo.
Pensadores como Owen, William Thompson, Jeremy Bentham afirmavam que a Revolução Industrial criou mudanças sociais que deveriam ser estudadas. Segundo Vico (1668-1744), a sociedade podia ser compreendida, pois, ao contrário da natureza, seria o próprio homem o agente produtor da história. Se o processo histórico possui lógico, pode ser compreendido e assim abrir novas pistas para o estudo racional da sociedade. Esta postura influenciou os historiadores escoceses da época, como David Hume (1711-1776) e Adam Ferguson (1723-1816), e seria posteriormente desenvolvida e amadurecida por Hegel e Marx.
Uma das correntes mais importantes desse mesmo século foi o iluminismo, originado na França. Os pensadores iluministas, enquanto ideólogos da burguesia, eram revolucionários que atacavam criticamente as características da sociedade feudal, seus privilégios e restrições, onde esta, ao impedir o estabelecimento da burguesia e crescimento do capitalismo, era considerada injusta e irracional, constituindo um obstáculo à liberdade do indivíduo, devendo ser eliminada. Para eles o indivíduo possuía razão, perfeição inata e era destinado à liberdade e à igualdade social. Reivindicavam a liberação do indivíduo de todos os laços sociais tradicionais e os próprios homens comuns passaram a ter igual conduta. Os tempos estavam mudando e a crescente racionalização da vida social iria contribuir para a constituição de um estudo científico sobre a sociedade.
A Revolução Francesa também foi uma circunstância que agilizou o processo de formação da Sociologia. Ao final do século XVIII, a monarquia absolutista da França estava assegurando inúmeros privilégios à minoritária classe dominante, enquanto deixava à margem de assistência uma população de 23 milhões de pessoas. Além disso, o arcaico sistema vigente impedia a constituição da livre empresa, a exploração eficiente da terra e abafava as iniciativas da burguesia. Obviamente, a situação era contraditória e não iria se sustentar por muito tempo e foi em 1789, com a mobilização das massas de trabalhadores pobres, que a burguesia tomou o poder. O seu objetivo, na realidade, não girava apenas em tomo da mudança da estrutura do Estado. Havia o claro desejo de abolir radicalmente a antiga forma de sociedade, suas instituições e seus costumes, promovendo e inovando aspectos da economia, da política, da religião e da vida cultural. Os velhos privilégios de classe foram destruídos e o empresariado passou a ser incentivado e apoiado.
Ao início do século XIX, o capitalismo emergente desencadeou o processo de industrialização na França, especialmente no setor têxtil. Determinadas situações sociais vividas pela Inglaterra no período de sua Revolução Industrial se repetiram na sociedade francesa - crises econômicas e divergências entre as classes sociais,
As transformações ocorridas com Revolução Francesa trouxeram a desorganização da sociedade e Saint-Simon, Comte e Le Play refletiam a fim de conhecer as leis que regem os fatos sociais, instituindo uma ciência da sociedade para poder repensar o problema da ordem social, enfatizando a necessidade da existência de instituição como a autoridade, a família, a hierarquia a destacando a importância teórica delas para o estudo da sociedade. Buscou-se o resgate dos papéis tradicionais
Os antagonismos de classe existentes na sociedade capitalista fizeram com que existissem diferentes visões sociológicas a respeito da sociedade, do objeto de· estudo e dos métodos de investigação dessa disciplina e a falta de um entendimento comum entre os sociólogos sobre a sua ciência possui, em boa medida, uma relação com a formação de uma sociedade dividida pelos antagonismos de classe. A existência de interesses opostos na sociedade capitalista penetrou e invadiu a formação da sociologia.
Sabe-se que a sociologia surgiu num momento de grande expansão do capitalismo e por isto mesmo alguns sociólogos otimistas afirmaram que os interesses e os valores da classe dominante eram representativos do conjunto da sociedade e que os conflitos entre as classes sociais eram passageiros, onde as lutas de classe não passam de acontecimentos transitório. 
Alguns deles defendiam a estabilidade das instituições religiosas, monárquicas e aristocráticas em franco processo de abolição, Edmund Burke (1729-1797), Joseph de Maistre (1754-1821) e Louis de Bonald (1754-1840) admiravam a estabilidade, a hierarquia social e as instituições religiosas e aristocráticas do feudalismo e, por outro, combatiam com fervor as idéias iluministas que teriam desencadeado, segundo eles, o trágico e nefasto acontecimento do final do século XVIII - a Revolução Francesa.
Tais idéias conservadoras influenciaram pioneiros da sociologia, interessados na preservação da nova ordem econômica e política que estava sendo implantada e que enxergavam a sociedade moderna em decadência, não consideravam nenhum progresso no urbanismo, na industrialização, na tecnologia e no igualitarismo. A sociedade lhes parecia mergulhada no caos, na desorganização e na anarquia, Afirmavam que para haver ordem e coesão social, seria necessário a existência de instituições fortes, tradição e vai ores morais.
Saint-Simon, Auguste Comte e Emile Durkheim foram influenciado pelas idéias conservadoras. Saint-Simon, admitia, mesmo tendo uma visão otimista da sociedade industrial, a existência de conflitos entre os possuidores e os não possuidores e afirmava a necessidade de uma ciência da sociedade para a restauração da ordem na sociedade francesa pós-revolucionária. Assim, a nova ciência passou a ser uma técnica de manutenção da ordem estabelecida e deveria descobrir as leis do progresso e do desenvolvimento social, onde sustentava a idéia de que os industriais e os cientistas deveriam procurar melhorar as condições de vida dos trabalhadores. Caberia, também, à ciência da sociedade descobrir novas normas capazes de guiar a conduta da classe trabalhadora, refreando seus ímpetos revolucionários.
Várias das obras de Saint-Simon seriam retomadas por Auguste Comte ('1798-'1857) e este reafirmava a idéia de anarquia e caos social. Entendia que se as idéias religiosas não teriam mais forças para reorganizarem a sociedade, muito menos as idéias dos iluministas e afirmava que para haver coesão e equilíbrio na sociedade seria necessário implantar a ordem e criar um conjunto de crenças comuns a todos os homens, assim, reverteria- se à situação de desorganização social vivenciada pelas sociedades européias e chegar gradativamente ao progresso.
No positivismo (1798-1857) a sociologia deveria utilizar em suas investigações os mesmo procedimentos das ciências naturais (observação, experimentação, comparação), Comte sustentava o estabelecimento de leis imutáveis, conforme as ciências físico-naturais ("Física social"), que deveria utilizar em suas investigações o mesmo método sistemático daquela ciência, dedicando-se à busca dos acontecimentos constantes e repetitivos da natureza e se possível, prever as crises sociais e evita-­las.
Foi com Émile Durkheim (1858-1917) que a sociologia ganha o "status" de Ciência, academicamente reconhecida, pois ele preocupou-se em estabelecer um objeto de estudo e um método para a sociologia, afirmando que nenhuma ciência poderia constituir-se sem uma área própria de investigação. Émile Durkheim, assim, como Comte, preocupou-se com a ordem social, mas via a industrialização com otimismo, sustentando a idéia de que os problemas, as crises não se resumiam à natureza econômica, como acreditavam muitas socialistas, mas sim à fragilidade da moral vigente, a ausência de regras e que para tanto deveria-se restabelecer a disciplina, criando novas idéias morais a fim de resgatar a consciência do dever, possibilitar relações estáveis entre os homens e, por conseguinte, neutralizar a crise econômicas. Está implícito aí que todos os participantes de uma sociedade devem agir do mesmo modo, as normas devem ser compartilhadas por todos. Quem eventualmente não agir como o grupo age é desviante, sofre sanções.
O seu pensamento marcou decisivamente e sociologia contemporânea, principalmente as tendências que têm-se preocupado com as questões da manutenção da ordem social. Foi no EUA que dois sociólogos americanos Mertom e Parsons, integraram a contribuição Durkheim ao pensamento sociológico contemporâneo no meio universitário, exercendo grande fascínio em inúmeros pesquisadores.
Marx (1818-1883) e Engels (1820-1903) com seu pensamento socialista influenciaram a formação e o desenvolvimento da Sociologia embora estes pensadores não estivessem preocupados em fundar a sociologia como disciplina específica, mas sim oferecer uma explicação da sociedade como um todo, colocando em evidência as suas dimensões globais. Para eles função da Sociologia não poderia se limitar apenas a solucionar os problemas sociais para restabelecer a ordem e o bom funcionamento da sociedade, como imaginavam os positivistas, (mas sim realizar mudanças radicais na sociedade) unindo teoria e ação, ciência e os interesses da classe proletária.
A Intenção é conferir à sociologia uma reputação científica encontra em Max Weber (1864-1920) um marco de referência. Max Weber, defendia a neutralidade científica, via o como homem do saber, das análises frias e penetrantes; segundo a qual o cientista jamais deveria defender preferências políticas e ideológicas a partir de sua atividade profissional, mas sim deveria oferecer ao homem de ação, a compreensão da sua conduta, das motivações e das conseqüências de seus atos, ao contrário dos conservadores, que procuravam estudar as instituições e os grupos sociais. Para Weber, cada problema deveria ser analisado cuidadosamente a fim de se descobrir que dimensão da realidade estaria condicionando as demais. Descartava o método de investigação científica das ciências naturais, proposto pelos positivistas para o estudo da sociedade. Weber defendia-se afirmando que a sociedade é dinâmica e não matéria inerte. Isso acarretaria um isolamento da Sociologia dos movimentos revolucionários e a profissionalização da disciplina. 
Weber via o capitalismo como resultado da modernização, não via nenhum atrativo no socialismo, o qual poderia acentuar os aspectos negativos da racionalização. Influenciado por Nietzche, a sua visão sociológica dos tempos modernos era melancólica e pessimista; uma postura de resignação diante da realidade social.
O desenvolvimento da Sociologia teve como pano de fundo a burguesia ascendendo politicamente e com freqüência utilizando mecanismos ideológicos e repressivos para assegurar sua dominação e evidenciando seu caráter transitório. A crise do capitalismo trouxe repercussões no pensamento sociológico contemporâneo. As ciências sociais - Antropologia, Ciência Econômica, Ciência Política - de modo geral, passaram a ser utilizada para produzir conhecimentos úteis à dominação vigente. A sociologia passou a ser empregada corno técnica de preservação das estruturas econômicas, políticas e culturais do capitalismo moderno.
  A profissionalização da sociologia, orientada para legitimar os interesses dominantes, constitui campo fértil para uma classe média intelectualizada ascender socialmente.
O desenvolvimento da Sociologia na Segunda metade do século XX foi muito afetado pela conjuntura política das duas guerras mundiais.
Os regimes totalitários vigentes, em alguns países europeus, envolveram-na na luta pela contenção da expansão socialista, pela neutralização dos movimentos de libertação das nações subjugadas pelas potências imperialistas, pela manutenção da dependência econômica dessas nações às potências e tolhiam a liberdade de investigação científica. Por isso, muitos intelectuais e cientistas que mantinham uma posição crítica em relação a esses regimes foram perseguidos. Nos últimos trinta anos, a postura conservadora passou a utilizar o método de investigação funcionalista, no qual prevalece a preocupação com a ordem social. Porém, os funcionalistas jamais questionaram a ordem estabelecida e implicitamente são favoráveis à sua.
Hoje vários sociólogos vêm desenvolvendo uma sociologia que auxilia na compreensão da sociedade capitalista atual quando critica a sociologia vinculada à preservação da ordem, contribuindo assim, para uma melhor compreensão da própria humanidade, mas é certo que, embora sejam várias as visões sociológicas é certo que são homens tentando explicar os próprios homens em sociedade.

Cristiano Lima
www.cristianolima.net