As pessoas que querem vencer




As pessoas que querem vencer são mais felizes? Nada nem ninguém as demovem de seu caminho. Elas são objetivas, pragmáticas e andam sempre em linha reta. De vez em quando escorregam, mas logo o bichinho da vitória as acorda para a vida colocando-as de volta no caminho que imaginaram para si. Não só uma vitória profissional, uma vitória qualquer. A glória.São pouco afeitas a surpresas e grandes demonstrações de sentimento. Não admitem que outras pessoas apareçam com propostas diferentes de olhar o mundo, não cedem um milímetro naquilo que consideram seu destino. Por isso se frustram frequentemente, pois é elementar que a única certeza dessa vida é que ela não segue qualquer script. Mas as pessoas que querem vencer são cartesianas; se elas identificarem algo ou alguém que pareça se interpor a seus desejos, corta-os imediatamente.Sim, elas sofrem. Até porque deve ser difícil abrir mão de tantas coisas boas em nome de uma meta. Mas é um sofrimento íntimo, oculto, inescrutável. Para o mundo exterior, elas são socialmente felizes, felicíssimas, como devem ser todos os vencedores. Mas, na hora do travesseiro, aquela que não mente para ninguém, queria ver como era o sono de uma pessoa que quer vencer.Elas não são más. São, simplesmente, assim. Acham que o mundo lhes deve, que chegou sua hora de chegar lá, que todos esses anos abrindo mão de tudo e todos não podem ser jogados fora. E são extremamente disciplinadas, minuciosas, detalhistas. Eu e você contrataríamos uma pessoa assim para trabalhar conosco. Sem pestanejar.Mas a vida não é feita apenas de contratos, nem com os outros nem consigo mesmo. Quantas vezes nós, comuns mortais que caminhamos em estradas sinuosas, já desejamos tanto alguma coisa que, quando finalmente a conquistamos, nos demos conta de que não era nada daquilo que estávamos pensando? E como lamentamos as tantas coisas que deixamos para trás nesse movimento. Já viram a novela Avenida Brasil? Nina, interpretada magistralmente por Débora Falabella, só pensa em vingança; Verônica (Débora Bloch) coloca pimenta nos cupcakes da amante de seu marido; Carminha (Adriana Esteves) passa por cima de tudo e todos em nome de uma vitória que nem ela sabe o que é. Foi assistindo à trama que pensei no desejo de vencer, sentimento digno da humanidade, mas e se a vitória não for legítima?O topo do pódio é um lugar à primeira vista animado e de extremo gozo, mas solitário. Já reparou como o primeiro lugar está sempre bem mais alto do que o segundo e o terceiro, que, por sua vez, estão muito mais próximos entre si em termos de altura? E a felicidade de um campeão só pertence a ele. Ninguém jamais sentirá ou compreenderá as emoções que ele está sentindo. As pessoas podem admirá-lo e aplaudi-lo por sua vitória, mas seguirão tranquilamente suas vidas sem o troféu que ele tanto almejou.As pessoas que querem vencer são extremamente sérias, fixas, sisudas, inatingíveis. Trazem consigo um silêncio talibã de intolerância ao que a vida pode trazer de diferente e surpreendente. São tão obstinadas que nós até torcemos para que elas consigam chegar lá.Mas também torcemos para que elas, no meio do caminho, por algum milagre, se deem conta de que a graça da vida não é vencer, mas lutar. Porque nessa luta estamos todos, em farta companhia, mesmo sem saber para onde estamos indo, nos ajudando, nos entendendo, nos apoiando, parando para respirar, tentando enxergar poesia não apenas nos fins, mas nos meios. E se, por acaso, algum companheiro cair nessa grande corrida, talvez não haja prazer maior do que dar uma parada no próprio caminho para ajudá-lo a se levantar.Torço pelas pessoas que querem vencer. E mais ainda para que, em seu caminho, elas não só olhem para frente, mas também para os lados, só para admirar as lindas paisagens que esse mundo tem a oferecer. Nina, a heroína da novela, passou o pão que o diabo amassou na mão da vilã Carminha, mas, ainda assim, as pessoas torcem o nariz para ela. Por quê? Porque a vitória para ela é a vingança. Vencer, ora veja, não significa vitória.

By Bruno Astuto